O adolescente ventríloquo
- àliteração.

- 16 de fev. de 2018
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Atualizado: 18 de fev. de 2018

O que vem na sua cabeça quando você pensa em festas de adolescentes? Óbvio, tem que ter bebidas alcoólicas, funk tocando e um revezamento de línguas tocando em outras. É impossível encontrar os amigos fora do espaço escolar sem que tenha pelo menos um desses três critérios. É surpreendente como todos os “rolês” de hoje em dia da faixa etária dos 13 aos 18 anos são exatamente iguais e como todos esses adolescentes se comportam da mesma forma, não é mesmo? Talvez não seja. Parece estranho, mas é visível: embora essas pessoas às vezes não queiram admitir, dentro de um grupo, todos se comportam, se vestem e agem igual, porque não conseguem e, principalmente, não querem buscar pela sua própria identidade.
Não querem porque é reconfortante viver na sombra dos passos do outro, na onda do “Maria-vai-com-as-outras”. Te garante uma vaga naquele grupo popular da série. Te oferece aquelas amizades que são a base para a afirmação de uma posição na hierarquia escolar. Te dá a certeza de que você superou um dos principais obstáculos dessa fase da vida: encontrar o seu lugar naquela imensidão de pessoas diferentes, que é o Ensino Médio. Mas, se pensarmos bem, há dois erros nessa última frase: 1) encontrar o seu lugar na escola é um grande obstáculo, sim, mas que, em verdade, não é superado quando você está simplesmente copiando outros ou se forçando a agir de certa forma para se encaixar naquele grupo; 2) o Ensino Médio, em teoria, é mesmo composto por pessoas muito diferentes, mas essas diferenças, no fim, não são notáveis, porque cada um acaba escondendo suas particularidades e fazendo o que viemos falando há 2 parágrafos: se tornando mais um ventríloquo da adolescência.
Sim, um ventríloquo da adolescência. Dessa expressão originam-se dois conceitos: o de que cada um desses jovens está sendo “manipulado” e está forjando ser algo que não é, e o de que, na verdade, não há ninguém puxando as cordas desses bonecos além da própria adolescência. Não existe nenhum “outro” para se copiar, não há um modelo incorporado em uma pessoa na qual as outras do grupo possam se basear. Todos estão buscando representar um estereótipo geral, um ideal proveniente do rótulo de adolescente, que é relativamente abstrato, e por isso estão constantemente procurando a aprovação uns dos outros. Mesmo que pareça que há um líder da matilha, esse indivíduo também nunca tem certeza do que deve fazer, pois depende plenamente do suporte de seus seguidores. Esses sujeitos “populares”, que parecem ser figuras fortes e seguras, destemidas e imprudentes, são frágeis por dentro, por manterem tais relações de julgamento de caráter, em que só é permitida a inclusão àqueles com “comportamento de adolescente”. Estão todos no mesmo barco, um barco bastante instável e que só pode navegar se todos a bordo estiverem remando em conjunto.
Esse ventriloquismo é um ciclo vicioso entre as gerações, porque mesmo mostrando-se ruim quando o descrevemos dessa forma, ele continua sendo aceito inercialmente por escolha individual, pelos benefícios e privilégios que o acompanham. O fim desse ciclo está marcado para quando todos perceberem que essas máscaras de “adolescente” estão apenas impedindo o seu crescimento intelectual como pessoas e cidadãos. Nessa idade, os jovens deveriam estar abrindo seus olhos e suas mentes para problemáticas muito maiores do que “quem bebe mais” ou “quem beija mais”, como talvez os seus objetivos de vida, as suas ambições, os seus sonhos, a sua identidade. Deveriam estar refletindo sobre o seu papel em um mundo de 7 bilhões de pessoas iguais a eles, vivendo na “mesmice”, sem saber o que fazer e, por isso, não fazendo nada. Pensando em formas de fazer alguma diferença, deixar uma marca, mesmo que seja ajudando uma pessoa ou melhorando o dia dela. Discutindo e conversando sobre temas importantes e se posicionando diante deles, definindo uma opinião própria e deixando de ser mais um transmissor das ideias de outros. Infelizmente, não é isso que acontece. Em vez disso, cada um deles está se fechando para sua autoformação e restringindo o seu próprio processo de descobrimento em prol de um título de popularidade.
Espero sinceramente que ações como esta, de se manifestar sobre o assunto, principalmente vindo de um dos que compõem a faixa etária dessa massa de navegantes do barco do ventriloquismo, revelem essa infeliz realidade e encorajem alguns a se libertar de suas cordas de bonecos, pular da embarcação e tentar nadar sozinhos, se dando a chance de se aventurar nesse mar de descobertas que é, realmente, a adolescência.
- anônimo




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