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- àliteração.

- 16 de jun. de 2018
- 2 min de leitura
Atualizado: 11 de ago. de 2018

Chovia. Pingava Fernando Pessoa nas ruas de Lisboa. Precipitava Oswald de Andrade, na metrópole paulistana. Caia. De saia. Acelerava querendo encontrar o chão. Ainda mais, arranhava a água na calçada de concreto e liberava o som da deformação, daquele encontro marcado já há muito, que sempre arranjava de tardar a acontecer. Tão meditada e mastigada era a ideia, que ninguém se impressionou quando finalmente chegou. Assim que as nuvens caíram, solo e céu fizeram amor. Em alguns artistas não publicados, pingados pela cidade, causou certo impacto o acontecimento. Talvez, porque estes haviam decidido desacostumar-se com os fenômenos sensíveis da existência, para que as sensações imediatas lhes ocorressem, no decorrer da vida, cada vez diferentes; talvez fosse apenas aquela tempestade em particular que fizesse mais barulho, de quando em vez, quando gotas mais pesadas estouravam no chão, misturadas nas que eram, essencialmente, garoa. Quer talvez, aqueles mesmos estivessem ouvindo os gritos pré-suicídio, ou mesmo fosse pois os tetos de suas casas eram mais finos que outros. Tiveram uns, qualquer seja o motivo, que não deixaram que aquilo passasse por eles em branco. Foram para a rua. Sentiram a água rolar pela pele exposta, as roupas pesando, os pés de encontro ao chão, os pelos arrepiando e os músculos contraindo. Olhavam para cima e viam a perspectiva que têm somente os loucos: as gotas de chuva por debaixo. Ficou claro para uns poucos dos que saíram de casa, então, que a vida vivida para o nunca, para o tédio e para o normal não fazia sentido. Nasceu a arte daqueles dessa forma, já que esta, só passou a ser arte, quando foi chovida. Atiraram-se, finalmente, os loucos a distribuir pensamento a quem quer que se dispusesse a ouvir. Frio, duro e doído, arriscando tudo, para que se formassem, pós caos, as formas mais lindas de luz.
- ss




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